Aumento da Tensão Elétrica em Instalações com Inversores Fotovoltaicos
14 março, 2022 por
Juliana Silva


O aumento da tensão elétrica durante o horário de funcionamento do(s) inversor(es) é normal e esperado dentro de uma faixa de valores de tensão. Porém, determinadas situações podem levar a paradas indesejadas por alarmes de sobretensão.

Introdução

Os instaladores e profissionais que atuam no mercado de energia solar fotovoltaica, acabam se deparando com um cenário similar ao descrito a seguir. Ao instalar um inversor fotovoltaico e conectá-lo à rede elétrica da concessionária é observado que a tensão elétrica da instalação local é alterada durante o horário de funcionamento do equipamento.

Muitos profissionais inexperientes podem sugerir que o observado seja resultante de um defeito ou má configuração do equipamento e descrevem o fenômeno com a seguinte frase: “o inversor aumentou a tensão da rede elétrica”.  Por exemplo, uma residência com instalação monofásica e com tensão 220V pode apresentar níveis de tensão acima de 240V, dependendo do horário, da potência e da quantidade de inversores instalados, além das características da instalação elétrica local.

O aumento da tensão elétrica durante o horário de funcionamento do(s) inversor(es) é normal e esperado dentro de uma faixa de valores de tensão. Nesse artigo iremos mostrar a origem desse fenômeno e discutir as prováveis causas de paradas por alarmes de sobretensão. 


Por que a conexão do(s) inversor(es) resulta em aumento da tensão local ?

É importante entender que os sistemas fotovoltaicos conectados à rede normalmente não regulam tensão. Esses sistemas regulam a corrente injetada na rede com base na amostragem de tensão local. Esta por sua vez é utilizada na malha de controle interna do inversor para produzir uma forma de onda de corrente que esteja sincronizada (ou não) com a rede elétrica local.

Isso significa que um inversor fotovoltaico do tipo On-Grid precisa estar conectado à rede elétrica para funcionar. Ao mesmo tempo, para que haja injeção de potência na rede elétrica é necessário que exista uma diferença de tensão entre os terminais do inversor e o ponto de conexão com a rede: o fluxo de corrente elétrica sempre é do maior para o menor potencial elétrico.

O diagrama da figura 1 abaixo modela simplificadamente a conexão de um inversor à rede elétrica. Entre o inversor e o ponto de conexão existem cabos, conectores, disjuntores etc. Cada elemento desse pode ser modelado através de pontos com resistências e indutâncias. Para o fluxo de potência existir no sentido inversor – rede é necessário que a corrente elétrica “supere” essas resistências e indutâncias locais.

 

Figura 1 – Esquema de ligação com inversor

Fonte: autoria própria

 

Da análise da figura 1 podemos escrever a seguinte equação:

 

        Vinv-Vrede=Req.Iinjetado       (1)

 

Onde Vinv é a tensão nos terminais do inversor, Vrede a tensão no ponto de conexão do inversor, Req a resistência equivalente de todos os elementos entre o inversor e a rede e Iinjetado a corrente produzida pelo inversor.

Podemos reescrever a equação anterior como em (2):

       Vinv=Vrede+Req.Iinjetado    (2)

A partir de (2) vemos que a tensão nos terminais do inversor sempre será maior que a tensão da rede em seu funcionamento.

No nosso exemplo, digamos que a resistência combinada de todos os elementos entre o inversor e a rede seja de 1,0 Ω (0,5 Ω em cada trecho do cabo) e um inversor de 10kW seja conectado a uma rede 220V. Supondo que o inverso esteja operando na sua potência nominal e com 16A de corrente, temos que a tensão nos terminais do inversor é de:

                                            Vinv=220+1.16A = 236 V

O exemplo anterior demonstra que para injetar energia na rede o inversor tem que elevar a tensão em seus terminais para vencer a queda de tensão provocada pelas resistências presentes na instalação. Vale notar que a tensão nos terminais do inversor, Vinv, não é fixa. O maior valor para Vinv  ocorre quando a corrente gerada pelo inversor é máxima, ou seja, no horário de pico de geração. Portanto, é no horário de pico de geração em que existe a maior probabilidade de ocorrências de alarmes de sobretensão.
 

O problema da sobretensão em sistemas FV

     A elevação de tensão ao conectar o inversor fotovoltaico à rede é normal, sendo que todas as cargas conectadas entre o inversor e seu ponto de conexão sentirão seu efeito. Porém, a elevação de tensão não pode ocorrer de forma descontrolada.

 Apesar de não regular a tensão local existe uma faixa operacional de tensão alternada em que o inversor poderá atuar. Essa faixa de tensão é determinada como uma função de proteção para condições anormais da rede.

Cada país adota em seu código de rede os níveis aceitáveis de tensão ao se conectar um inversor fotovoltaico. Níveis de tensão fora da faixa determinada no código de rede requerem que o inversor pare a sua geração e seja desconectado de forma automática (seja o sistema monofásico ou trifásico). O funcionamento do sistema é retornado assim que os níveis de tensão voltem ao intervalo aceitável. 

A NBR 16149 defini um intervalo entre 80% e 110% da tensão nominal para operação dos inversores. A desconexão em caso de violação desses limites não é instantânea e existe um tempo de atraso para considerar variações transitórias da rede, evitando desconexões excessivas. Para o caso de uma rede de tensão nominal de 220V, um valor de 242V nos terminais do inversor por mais que 0,2s é suficiente para haver a desconexão do equipamento.

A situação anterior requer que o inversor indique ao usuário que houve uma desconexão por sobretensão através de um alarme. Quais são as consequências geradas por um alarme de sobretensão ?

Primeiro há uma perda de receita, pois o inversor é impedido de continuar gerando energia enquanto durar o alarme. Essa perda pode ser significativa pois alarmes de sobretensão podem ocorrer com frequência e geralmente ocorrem em horário de picos de geração - Figura 2. No horário de pico a corrente Iinjetado  é maior, por sua vez aumentando a  tensão sentida pelo inversor, segundo a equação (2).  

Percebe-se na figura 2, ainda, que houve quedas (desligamentos) por alta tensão, foi plotado a tensão de saída CA, e o sistema estava parametrizado com a configuração de parâmetros para o Brasil, então, toda vez que o sistema ultrapassa 242 V (10% a mais da nominal de 220 V, de acordo com a norma) ele desliga por proteção.

 

Figura 2 – Gráfico da potência do inversor, apresentando altas tensões CA.

Além disso, todas as cargas locais e conectadas perto do inversor vão ser impactadas. Assim, podem haver danos a cargas mais sensíveis ao nível de tensão caso não haja monitoramento e controle local.

Evitando alarmes de sobretensão e parada de geração

A partir da análise da equação (2) pode-se identificar prováveis causas para um alarme de sobretensão na rede de corrente alternada do inversor.

A equação (2) mostra que a tensão nos terminais do inversor depende da tensão da rede local. Fato obvio, mas importante. Conclui-se que quanto maior a tensão da instalação elétrica maior é a tensão no inversor e mais provável é um alarme de sobretensão.

Esse ponto é relativamente importante quando se trabalha em redes rurais, onde o nível de tensão tende a ser maior e a qualidade de energia é reduzida ou precária. Fenômenos transitório como remanejamento de cargas ou de alimentador da concessionária podem resultar em alarmes de sobretensão. Além disso, muitos inversores conectados a uma mesma rede de baixa tensão contribuem para ocorrência desse alarme, principalmente, em períodos de baixo consumo e alta geração.

O aumento da resistência equivalente, Req,  em (2) é outro fator contribuinte para tensões fora dos limites aceitáveis. Aqui Req  equivale a soma das resistências de cabos, disjuntor, conexões mecânicas, transformador, conector CA do inversor etc. Assim, um conector defeituoso (muito apertado ou mau conectado), se torna um ponto de alta resistência e de aquecimento, contribuindo para o aumento de tensão de todo o sistema. Um simples conector CA do inversor, caso seja mau encaixado pode levar a esse tipo de alarme.

A resistência equivalente do sistema vai ser impactada pela escolha do cabo CA. A resistência desse cabo é proporcional ao seu tamanho e inversamente proporcional a sua secção transversal: quanto maior e mais fino o cabo maior sua resistência total. Então, colocar o inversor em distância mais próximas do seu ponto de conexão e fazer o dimensionamento corretamente podem evitar paradas indesejadas.

Por fim, a elevação de tensão depende do fator Iinjetado.  Em outros palavras quanto maior a potência do inversor ou o somatório de potências instaladas, maior a corrente injetada e o risco de uma sobretensão CA. Esse risco aumenta em situações de baixa carga e alta demanda. Além disso, vale nota que Iinjetado  varia conforme a geração ao longo do dia. 

Resumo

Esse artigo teve como objetivo apresentar uma explicação simplificada ao leitor sobre o assunto de elevação de tensão CA em sistemas fotovoltaicos. Esse é um fenômeno natural, mas que muitos profissionais não compreendem com clareza.

A elevação de tensão nos terminais dos inversores é algo necessário para que haja o fluxo de potência no sentido do inversor para a rede elétrica da concessionária. Porém, alguns fatores podem contribuir para que a tensão local se eleve acima dos limites definidos no código de rede nacional e estabelecido na NBR16149.

Muitos pontos podem contribuir de forma simultânea e tornar a análise de um alarme de sobretensão mais complicada. Os pontos críticos que devem ser investigados incluem o nível de tensão entregue pela concessionária ao cliente, análise de geração e demanda local, dimensionamento de cabos, além de verificação de conectores defeituosos ou utilizados de forma incorreta. 

Referências

ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas NBR 16149 – Sistemas fotovoltaicos (FV) - Características da interface de conexão com a rede elétrica de distribuição Março de 2013.

ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas NBR 16690 - Instalações elétricas de arranjos fotovoltaicos – Requisitos de projeto - Outubro de 2019.

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