Compatibilidade entre Módulos de Alta Potência e Inversores Fotovoltaicos
26 janeiro, 2022 por
Juliana Silva


Considerações técnicas e impactos para a geração de energia em aplicações com módulos 500W+


Introdução

À medida que a potência e corrente de operação dos módulos aumentam é comum que surjam dúvidas em relação a segurança do sistema e a possíveis perdas de energia. Assim, é necessário analisar as características elétricas dos módulos e inversores atuais e compreender como módulos de alta potência podem impactar na escolha do inversor FV e na geração de energia. 
Historicamente, os fabricantes de módulos fotovoltaicos (FV) buscam melhorar a potência e eficiência dos seus equipamentos. Esses dois parâmetros estão diretamente associados com a produtividade de energia e ao custo nivelado (LCOE) do sistema. De forma simplificada, mantendo a eficiência constante, a elevação de potência implica em maior geração de energia e redução no LCOE.  
A nível global os fabricantes de módulos FV passam por uma evolução tecnológica acelerada, onde mesmo durante o período de pandemia são anunciados módulos com melhor desempenho e de forma constante. Há três anos atrás os módulos de 350W eram considerados equipamentos de alta potência. Já em 2021, foram introduzidos no mercado brasileiro módulos de potência acima de 600W e eficiência ultrapassando os 21% [1].   
Da mesma forma, os fabricantes de inversores FV atualizam seus produtos para atender um mercado cada vez mais competitivo e exigente em relação a confiabilidade, vida útil e funcionalidades do equipamento. Há 20 anos, os inversores FV eram projetados para realizar as funções de rastreamento de máxima potência e conversão de corrente contínua em alternada. Hoje, o mesmo equipamento deve realizar essas funções, assim como, monitorar o sistema como um todo, garantir a sua segurança e atender requisitos de conexão com a rede elétrica cada vez mais rigorosos. 
No entanto, a atualização dos inversores FV nem sempre acompanha a evolução dos módulos. É comum surgirem no mercado módulos de maior potência primeiro e em seguida os fabricantes de inversores atualizarem seus produtos para serem compatíveis com aquela nova tecnologia. Por exemplo, módulos com potência acima de 500W possuem correntes de operação e curto-circuito elevadas e, nem sempre compatíveis com os inversores disponíveis no mercado. 

Características elétricas dos módulos 500W+ 

  Para otimizar os valores de eficiência e potência, os fabricantes investem em avanços tecnológicos a nível de célula e do módulo FV. A nível da célula têm-se realizado sucessivos progressos em relação a dopagem, mudança de tecnologia de multicristalina para monocristalina, adição de uma camada de passivo (PERC) etc. Do mesmo modo, modificações nas características do EVA e da pintura anti-reflexiva (AR), aumento na quantidade de barramentos (MBB) e uso de células half-cell visam melhorar o desempenho do módulo.  

 Uma outra abordagem para aumentar a potência dos módulos é ampliar o tamanho dos wafers de silício. O wafer de silício corresponde ao bloco básico para construção das células FV. Sua dopagem química permite construir as células e, por sua vez, as ligações elétricas das células formam os módulos FV.  

Utilizar wafers de silício maiores permite gerar mais energia devido a maior área de contato com a irradiância solar. Por esse motivo, nos últimos anos os fabricantes de módulos têm adotado módulos com wafers maiores, sendo que a tecnologia M10 (182 mm) e G12 (210mm), serão predominantes no mercado global a partir de 2021 (Figura 1).

                Figura 1: Participação no mercado de diferentes tamanhos de wafers silício [2]. 


Em geral, o aumento das dimensões do módulo resulta em maior potência de operação e, por sua vez, eleva a corrente de operação e de curto-circuito. A figura 2 exibe as características elétricas para uma família de módulos entre 530W e 550W e com células M10 (182mm).  

Figura 2: Características elétricas para uma família de módulos com células M10 [3]. 



Para essa família a corrente de curto-circuito pode variar entre 13,71A e 13,98A nas condições de STC (standard test conditions). Já a corrente de operação ou de máxima potência atinge o valor mínimo de 12,82A para o módulo de 530W e ultrapassa os 13,1A para o módulo de maior potência.  

Em módulos com células G12 (210mm) as correntes tendem a valores ainda maiores. Por exemplo, os módulos entre as potências de 585W e 605W exibidos na figura 3 possuem corrente de operação e curto-circuito em STC, acima de 17A e 18A, respectivamente.  

Figura 3: Características elétricas para uma família de módulos com células G12 [4].


Como observado nas famílias de módulos M10 e G12 anteriores, a corrente de operação dos módulos de alta potência atuais são maiores que 13A e podem atingir valores acima dos 17A. Enquanto isso, encontra-se no mercado, inversores com corrente de entrada entre 11A e 16A. Essa diferença entre a corrente de operação dos módulos e a corrente de trabalho do inversor traz questionamentos em relação à compatibilidade entre esses componentes e o impacto para a geração de energia.  


Operação dos inversores com módulos de alta potência


Todo inversor FV possui um intervalo bem definido de tensão e corrente onde poderá operar e rastrear o ponto de máxima potência das strings conectadas às suas entradas. É nesse intervalo onde o inversor consegue otimizar a geração de energia dos módulos e operar de forma segura.  

    Para a corrente geralmente são exibidos na folha de dados a máxima corrente de curto-circuito e valor máximo de operação por mppt. O primeiro corresponde a um fator de segurança e o projetista deve garantir que o somatório das correntes por mppt não ultrapasse esse valor. O segundo reflete a capacidade máxima de operação do mppt, ou seja, o valor limite de corrente que o equipamento consegue operar e rastrear o ponto de máxima potência.  

O valor máximo de operação é menor que a máxima corrente de curto-circuito do mppt. Sendo assim é possível trabalhar com valores de corrente acima da corrente máxima de operação e menor que a corrente de curto-circuito sem causar danos ao equipamento. A tabela 1 abaixo exibe valores típicos de correntes encontradas para um inversor monofásico de 10 kW.    

    

 Tabela 1: Corrente máxima de operação e curto-circuito por entrada para um inversor de 10kW [5]. 

Inversor de 10 kW 

Corrente Máx. de Operação 

14 A 

Corrente Máx. De Curto-Circuito 

22 A 


 No caso do inversor com as características de corrente mostradas na tabela 1, a corrente de operação é limitada em 14A mesmo que os módulos estejam em condições de temperatura e irradiância que os permitam trabalhar com correntes maiores. Em teoria, a limitação de corrente desse exemplo resultaria em perdas de geração de energia para o sistema.           

No entanto, para os níveis de sobrecargas utilizados no Brasil a limitação de corrente tende a ocorrer simultaneamente ou mesmo depois da limitação por potência. No último caso, o ponto de operação na curva I-V da string é modificado pelo inversor de forma a manter a potência de saída do equipamento em seu valor máximo.  

Assim, um módulo com corrente de operação levemente superior a corrente máxima de operação do inversor possui um efeito positivo, gerando energia adicional quando o inversor não estar operando em sua potência máxima. Porém, um valor muito discrepante entre a corrente do módulo e a corrente de operação pode aumentar as perdas por limitação de corrente, principalmente, em situações de baixa sobrecarga. 


Comparação de desempenho  


Nessa seção serão desenvolvidas simulações comparando o desempenho de dois inversores com características diferentes de corrente, considerando um mesmo sistema com módulos de 600 W. 

Para realizar esse estudo de caso foi utilizado o PVSyst, software específico para dimensionamentos de projetos fotovoltaicos. Neste software foram realizadas duas simulações para o mesmo sistema e, mantendo a topologia, módulos e potência do inversor inalterados. A única diferença é a corrente de trabalho por entrada do inversor. 

 A primeira simulação utiliza um inversor de 3 kW com corrente máxima de entrada por string de 11 A. A segunda, considera-se um inversor de mesma potência, porém com corrente de entrada de 14 A. O módulo fotovoltaico utilizado foi o mesmo em ambas as simulações e possui corrente de operação (Imp) nas condições STC de 17 A. 

A figura 4 representa as perdas por corrente de entrada no primeiro inversor (corrente de 11 A). Já a figura 5 representa as perdas por corrente de entrada no segundo inversor (corrente de 14 A). Como esperado o inversor com corrente de trabalho de 11 A limita a corrente de operação do módulo resultando em perdas de geração para o sistema. Por outro lado, o segundo inversor não apresentou perdas por limitação nas condições simuladas.  

 

Figura 4 – Perdas de 3,83% devido a máxima corrente de entrada do inversor 

Fonte: autoria própria 

 

Figura 5 – Perdas de 0,00% devido a máxima corrente de entrada do inversor 

Fonte: autoria própria 


É importante analisar esses fatores na hora de realizar seu projeto fotovoltaico para entregar ao cliente final a geração esperada. É claro que no primeiro caso, da figura 4, se você considerar em seu projeto essas perdas e mesmo assim conseguir entregar a geração necessária para abater o consumo do cliente, o projeto também é totalmente válido. 

Graficamente, o comportamento da potência (curva vermelha), tensão da string (curva azul) e corrente de trabalho (curva verde) se assemelham a figura 6 e figura 7. No primeiro caso, a corrente de entrada do inversor é maior, produzindo mais energia quando comparado ao segundo caso, em que a corrente de entrada é menor, pois não há limitação do inversor. 

Figura 6 – Inversor produz energia de forma eficiente e sem limitação na corrente de operação do módulo 

Fonte: Solis 


 Figura 7 – Inversor apresenta limitação na sua geração de energia devido a menor corrente de entrada 

Fonte: Solis 


Considerações Finais 

Um sistema fotovoltaico precisa ser bem dimensionado e o projeto bem executado para que não haja comprometimento na geração de energia esperada pelo cliente. Apesar de ser possível utilizar os módulos fotovoltaicos de maior potência em inversores com corrente de entrada mais baixa é necessário conhecer seus impactos para o sistema e quais considerações devem ser levadas em conta para garantir a geração de energia esperada. É válido nesses casos fazer a simulação para analisar a energia gerada estimada. 

Utilizar módulos com correntes superiores a entrada máxima do inversor, não causa danos aos equipamentos, contanto que sejam respeitados os limites de correntes de curto-circuito do equipamento. 


Fontes: 

 

[1] https://www.byd.com.br/byd-lanca-tres-novos-modulos-fotovoltaicos-na-intersolar-south-america-2021-e-anuncia-investimentos-em-fabrica-do-brasil/ 

 

[2] http://taiyangnews.info/technology/wafer-sizes-and-their-market-share/ 

 

[3] https://en.longi-solar.com/uploads/attach/20210512/609b52d379717.pdf. Acesso em 27/12/2021. 

 

[4] https://www.apex-solarenergy.com/mono-585-605w-product/. Acesso em 27/12/2021. 

 

[5] https://www.ginlong.com/solarinverter3/7-10kw_s5_br.html. Acesso em 27/12/2021.
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