Você sabe interpretar as informações encontradas nas folhas de dados de inversores e módulos fotovoltaicos?
1 dezembro, 2021 por
Juliana Silva


Introdução

A folha de dados ou datasheet é um documento técnico que fornece as especificações para um determinado produto (DICIONÁRIO OXFORD). Este documento deve ser disponibilizado pelo fabricante e servir como uma ferramenta de orientação técnica para projetistas, engenheiros, técnicos e operadores do equipamento.

Em geral muitas informações técnicas são disponibilizadas em uma folha de dados e nem sempre essas informações são exibidas ou organizadas de forma clara ao usuário. Além disso, é comum que a folha de dados original do fabricante esteja em outro idioma como o Inglês ou Mandarim e, durante a tradução para o Português, perca-se a clareza da informação original.

Sendo assim, você sabe quais informações devem ser analisadas em uma folha de dados para ter o melhor aproveitamento no seu projeto, realizar o correto dimensionamento e operar o sistema de forma adequada? Este artigo aborda os principais parâmetros técnicos presentes nas folhas de dados de módulos e inversores para aplicações FV de forma descomplicada, mas sem perder o teor técnico.

Principais problemas ao não respeitar a folha de dados do equipamento.

A folha de dados técnicos é um dos meios utilizados pelos fabricantes para descrever as principais características do produto, como: a sua faixa nominal de operação, as proteções acopladas ao equipamento, registrar os limites elétricos, mecânicos, e térmicos do produto etc. Todas as informações descritas na folha de dados devem ser estudadas, compreendidas e sempre disponibilizadas para consultas em escritório ou em campo. Uma informação desprezada ou não interpretada de forma correta pode resultar em perdas financeiras para o cliente, além de trazer riscos à operação do equipamento ou as pessoas envolvidas com a instalação FV.

Por exemplo, o nível de tensão em corrente alternada (CA) estabelecido na folha de dados para um inversor deve ser observado e comparado com o nível de tensão da instalação logo no momento da compra deste equipamento. Um inversor projetado para operar com tensão de 380Vf-f e instalado em uma rede elétrica de 220Vf-f, irá emitir um alerta de baixa tensão (subtensão) e não funcionará. Nesse caso, será necessário a troca do equipamento por outro com nível de tensão adequado ou o uso de transformador/autotransformador para compatibilizar os níveis de tensão. Tal situação resulta em perdas de receita para o cliente e poderia ser evitada através de um exame mais cuidadoso da folha de dados do inversor. Da mesma forma, a folha de dados dos módulos FV apresentam informações valiosas e requerem um profissional qualificado para sua análise e interpretação.

Outro exemplo é o mau dimensionamento do disjuntor CA, que, pode desarmar, isso causa perdas de geração.

O excesso de módulos fotovoltaicos em um arranjo (string) também pode causar danos aos equipamentos, e se isso acontecer, você provavelmente perderá a garantia, visto que os parâmetros impostos pelo fabricante não foram respeitados.

Veremos a seguir, mais especificamente, os principais itens das folhas de dados dos módulos fotovoltaicos e dos inversores.


Folha de dados do Módulo Fotovoltaico

Os módulos FV são os componentes responsáveis por absorver e converter a energia dos raios solares em energia elétrica na forma de corrente contínua (CC). Sendo um dos principais componentes de um sistema FV, às suas características elétricas associadas aos fatores de instalação vão determinar o montante de geração de energia por toda a vida útil do produto, além do tempo de retorno (payback) da instalação.

As características elétricas dos módulos são dependentes de parâmetros, como: a tecnologia utilizadas pelas células FV (monocristalina, policristalina, filme fino, half-cell, PERC, etc), tamanho da células (e.g., 188mm ou 210mm), quantidade de barramentos no módulo (multi-busbar), dopagem tipo n ou p, conexão e número das células (72 células, 144 células, 156 células etc), tamanho do módulo, entre outras aspectos de fabricação. Dentro das inúmeras técnicas utilizadas pelos fabricantes de módulos FV, cada uma apresenta propriedades mecânicas, elétricas, e desempenhos distintos. Exemplificando, os módulos com tecnologia meia célula (half cell) possuem eficiência e resistência mecânica incrementadas, menor degradação pelo efeito da temperatura, e seu desempenho é menos impactado pelo efeito do sombreamento parcial quando comparados com os módulos monocristalinos com células padrões (JA). As tecnologias exemplificadas e utilizadas na composição do módulo FV são geralmente apresentadas na folha de introdução do produto. Cabe ao projetista em conjunto com o cliente final avaliar qual a tecnologia que melhor atende às suas necessidades de geração, mantendo uma boa relação de custo/benefício.

A garantia de desempenho dos módulos FV também é um ponto que deve ser observado na folha de dados do fabricante. Os módulos comercializados atualmente possuem garantia de desempenho entre 25 e 30 anos de operação.

Isso significa, que ao fim da sua vida útil os módulos vão apresentar potência de saída entre 80% e 85% do seu valor inicial, conforme figura 1. Essa degradação ocorre porque durante a operação em campo, os módulos são submetidos a influência e variação constante do nível de temperatura, irradiância, umidade, esforços do vento, além de possuírem uma degradação natural devido às combinações químicas que ocorrem internamente nesse componente.

 

Figura 1: Curva de degradação linear de desempenho em função da vida útil do módulo.

Fonte: Trina Vertex

 

 

São muitos os pontos onde os módulos FV podem apresentar falhas. Esses componentes são suscetíveis a defeitos na caixa de junção onde estão localizados os diodos de by-pass, trincamento ou quebra do vidro, frame metálico solto, falhas nos diodos ou no backsheet, corrosão das trilhas metálicas etc (PVEL). Por esse motivo, a operação confiável e segura dos módulos FV depende de um controle estrito do processo de fabricação, assim como, o uso de componentes de qualidade. Caso contrário, a falha em realizar o controle de qualidade adequado durante o processo de fabricação ou o uso de componentes de baixa qualidade podem levar a falha prematura do módulo, causando riscos às pessoas e a instalação FV.

É verificado que as células e os módulos FV seguem um comportamento de operação bem definido e previsível. Este comportamento é descrito graficamente através da curva I-V, a qual associa a tensão (V) e corrente (I) de operação dos módulos FV para diferentes níveis de irradiância e  temperatura Figura 2. Os principais pontos da curva I-V são informados na folha de dados do fabricante do módulo e são descritos nos próximos parágrafos.

 

Figura 2 – Curva I-V do Módulo FV

Fonte: Trina Solar

 

A Figura 3 mostra os dados técnicos para uma família de 5 módulos FV, do fabricante JA Solar. Os dados são fornecidos em condições STC (do inglês Standard  Test Conditions), isto é, a condição padronizada em que eles foram testados em laboratório: irradiação de 1000 W/m², temperatura da célula de 25 ºC e massa do ar de 1,5G. Na mesma folha de dados o fabricante também fornece os dados em NOCT (do inglês Nominal Operating Cell Temperature). Enquanto os valores em STC são para condições encontradas com maior frequência em laboratório, as premissas simuladas em NOCT tentam refletir com maior proximidade às condições ambientais encontradas em campo durante a operação do módulo: irradiação de 800 W/m², temperatura ambiente de 20 ºC, 1 m/s de velocidade do vento e massa do ar de 1,5G.

 

Figura 3 – Família de módulos fotovoltaicos

Fonte: JA Solar

 

O fabricante exibe na Figura 3, as características elétricas para módulos com tecnologia de meia célula e com potência entre 435W e 450W. A primeira informação disponibilizada é a identificação do módulo para fins comerciais. Logo em seguida é possível encontrar a potência máxima do módulo em Watts. Para o módulo identificado com JAM78S10-445MR essa potência é de 440W e representa o máximo que o módulo consegue produzir nas condições de STC.

É importante salientar que em campo os módulos vão operar frequentemente abaixo dessa potência devido aos efeitos de irradiância e temperatura sobre a sua curva I-V. Além disso, os módulos possuem uma tolerância no valor de potência máxima. Para essa família a tolerância máxima é de 5W, como mostrado na folha de dados. Isso significa que módulos produzidos sobre as mesmas condições em fábrica (e mesma remessa) vão apresentar uma leve diferença de potência máxima.

A folha de dados também exibe informações sobre a tensão e corrente de operação dos respectivos módulos: Tensão e corrente na máxima potência, tensão de circuito aberto e corrente de curto-circuito. Esses parâmetros são essenciais para a escolha do inversor e da topologia do sistema FV. Em seguida são apresentadas as definições de cada uma dessas componentes:

A tensão de circuito-aberto (Voc) é o valor máximo, medido entre o terminal positivo e negativo, que o módulo vai apresentar nas condições de STC. Essa grandeza é utilizada na fase de projeto para determinar o número de módulos que serão conectados em série em uma string FV. Módulos em série conduzem a mesma corrente elétrica e somam suas tensões. A somatória da Voc de todos os módulos pertencentes a uma mesma string deve ser menor que a tensão máxima suportada pelo inversor, de forma a não causar falhas ou danos ao equipamento.

As células e módulos FV podem ser modelados matematicamente como uma fonte de corrente. A partir disso, a corrente de curto-circuito (Isc) é o valor máximo de corrente que o módulo produzirá com seus terminais em curto-circuito. Essa grandeza é utilizada para determinar a quantidade de strings que podem ser inseridas em paralelo dentro de um mesmo MPPT (rastreador de máxima potência). As strings em paralelo tem suas correntes adicionadas na entrada do inversor e o valor resultante deve ser menor que o máximo permitido pelo inversor.

A tensão (Vmp) e corrente (Imp) são características apresentadas pelo módulo no ponto de máxima potência de operação. Nessa combinação de tensão e corrente o módulo estará operando em condições ideais e produzirá a sua máxima potência.

Qualquer variação de tensão ou corrente resulta em uma alteração no ponto de operação do módulo na curva I-V e redução na sua potência de saída. Com base nisso, o algoritmo de rastreamento de máxima potência do inversor (MPPT) irá sempre buscar esse ponto de operação.

É importante mencionar que a tensão (Voc), corrente (Isc) e potência máxima (Pmáx) do módulo variam conforme a temperatura ambiente. Conforme explicado anteriormente os valores informados na folha de dados são para as condições em STC o que estabelece a temperatura padrão de 25C nas células FV. Em campo dificilmente essas condições são atendidas e, por isso, o fabricante fornece coeficientes de correção ou ajuste para calcular os novos valores dessas grandezas nas condições de operação do sistema FV - Figura 4.

 

Figura 4: O desempenho do módulo FV é alterado por variações de temperatura conforme os

coeficientes de ajuste fornecidos pelo fabricante.

 

Conforme a Figura 4, a corrente de curto-circuito (Isc) é pouco impactada por variações térmicas, tendo um leve acréscimo com o aumento da temperatura local. Por outro lado, a VOC e Pmáx do módulo possuem uma relação inversamente proporcional com a temperatura. Quanto menor for a temperatura local maior é o valor de VOC e potência máxima do módulo.

Além dos parâmetros elétricos descritos anteriormente, o projetista deve estar atento a parâmetros como eficiência do módulo, tensão máxima de operação e corrente reversa máxima suportada (fusível máximo). A eficiência quantifica a capacidade do módulo em converter energia incidente em energia útil para o sistema. Para os módulos atuais essa taxa de conversão fica entre 15% e 23%. Para determinar a eficiência do módulo, o equipamento é testado nas condições de STC. Sob essas condições de teste, um módulo com eficiência de 15% e com uma área de superfície de 1m² produziria 150 Watts. Portanto, quanto maior a eficiência do módulo utilizado menor será a área necessária para gerar a mesma quantidade de energia.

Fatores como tensão máxima, intervalo de temperatura e fusível de série máxima (Figura 5) especificam as condições limites de operação do módulo e devem ser respeitados de forma a não causar danos prematuros ou falha completa do equipamento.



 

Figura 5: Condições de operação definidas pelo fabricante na folha de dados


Folha de dados do Inversor Fotovoltaico

Para gerar energia útil ao consumo do cliente ou operar de acordo com a regulamentação para compensação de energia é necessário de um meio que converta a energia produzida pelos módulos em corrente contínua em corrente alternada. Essa é uma das funções desempenhadas pelo inversor fotovoltaico. Mas como identificar informações importantes, analisá-las e compreendê-las a partir da folha de dados de um inversor?

A figura 6 foi retirada de um fabricante de inversor e nessa folha de dados, pode-se verificar alguns parâmetros importantes para o dimensionamento do sistema.

Figura 6 – Na folha de dados são encontradas propriedades do equipamento no lado de corrente contínua (CC) e corrente alternada (CA)

Fonte: www.ginlong.com

É importante respeitar os limites máximos que a folha de dados do inversor mostra, por exemplo, na figura 6 a máxima tensão de entrada é 1100 V. A partir disso, o dimensionamento deve ser feito com o Voc do módulo fotovoltaico e considerando correções para as condições climáticas do local. É provável que o inversor emita um alerta, relacionado a tensão do barramento CC, quando esse valor máximo for violado. Em casos extremos, pode ocorrer a queima e perda completa do equipamento.

A corrente máxima de curto-circuito que o equipamento suporta do lado de corrente contínua. O que isso quer dizer? Isso significa que de maneira alguma, a corrente de operação do módulo FV (Imp) deve ultrapassar essa corrente. Se isso acontecer, pode causar danos ao equipamento. Ah, mas a Imp passa apenas a corrente máxima da string, tem problema? Isso deve ser confirmado com o fabricante, mas, a maioria limita o valor estipulado em sua folha de dados.

É importante verificar a tensão de saída do inversor, pois dependendo da rede elétrica do local, a necessidade de elevação ou rebaixamento da tensão é necessária através de um transformador de potencial. Além disso, é necessário entender que tipo de tensão e de ligação que pode ser feita, por exemplo, de acordo com a figura 6 a tensão é 220 V trifásica, com ligação de três fases e terra. 

Um outro parâmetro importante a ser analisado no datasheet do inversor é a corrente máxima de saída. É com esse valor que você dimensiona o disjuntor CA de proteção. É claro que fatores como distância até o ponto de conexão, método de instalação (dentro de eletroduto, eletrocalha, leito, enterrado, aparente etc.), fatores de temperatura e de agrupamento devem ser           considerados. Na figura 6 é indicado que a corrente máxima poderá chegar até 173,2 A, para o modelo de 60 kW.

Por fim, é preciso entender quantas MPPTs e entradas por MPPT o inversor possui, pois isso ajuda no momento do projeto, para distribuição dos módulos fotovoltaicos, principalmente em telhados, quando se tem caídas (águas) diferentes. Na figura 6 é indicado que o inversor possui 6 MPPTs, com 2 entradas cada MPPT.


Todos os outros parâmetros devem ser levados em conta para um bom dimensionamento e desempenho do sistema. E agora? Acha que está pronto para realizar um bom projeto? Fique ligado para os próximos artigos contendo muitas dicas!

 

Fontes:

[JA] -- https://www.jasolar.com//uploadfile/2020/0508/20200508101149946.pdf [PVEL] - 2021 Pv Module Reliability Scorecard

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